Brilho misterioso na Via Láctea pode ser uma evidência de matéria escura

A Via Láctea por cima dos telescópios de Roque de los Muchachos em La Palma, Ilhas Canárias.
Crédito: Ralf Geithe/Getty Images

Investigadores identificaram o que poderá ser uma pista convincente na caça em curso para provar a existência da matéria escura.

Um misterioso brilho difuso de raios gama perto do centro da Via Láctea tem deixado os investigadores perplexos durante décadas, enquanto tentam discernir se a luz provém de partículas de matéria escura em colisão ou de estrelas de neutrões em rápida rotação.

Acontece que ambas as teorias são igualmente prováveis, de acordo com uma nova investigação publicada na revista Physical Review Letters.

Se o excesso de raios gama não for proveniente de estrelas moribundas, pode tornar-se a primeira prova de que a matéria escura existe.

“A matéria escura domina o Universo e mantém as galáxias unidas. É extremamente importante e estamos sempre a pensar desesperadamente em ideias para a detetar”, disse o coautor Joseph Silk, professor de física e astronomia na Universidade Johns Hopkins e investigador no Instituto de Astrofísica da Universidade de Sorbonne e no CNRS (Centre national de la recherche scientifique). “Os raios gama, e especificamente o excesso de luz que estamos a observar no centro da nossa Galáxia, podem ser a nossa primeira pista”.

Silk e uma equipa internacional de investigadores, liderada por Moorits Muru, do Instituto Leibniz de Astrofísica de Potsdam, utilizaram supercomputadores para criar mapas da localização da matéria escura na Via Láctea, tendo em conta, pela primeira vez, a história da formação da Galáxia.

Atualmente, a Via Láctea é um sistema relativamente fechado, sem materiais a entrar ou a sair dela. Mas nem sempre foi assim. Durante os primeiros mil milhões de anos, muitos sistemas semelhantes a galáxias mais pequenas, feitos de matéria escura e outros materiais, entraram e tornaram-se os blocos de construção da jovem Via Láctea. À medida que as partículas de matéria escura gravitavam em direção ao centro da Galáxia e se agrupavam, o número de colisões de matéria escura aumentava.

Quando os investigadores consideraram colisões mais realistas, os mapas simulados corresponderam aos mapas de raios gama reais obtidos pelo Telescópio Espacial de Raios Gama Fermi.

Estes mapas concordantes completam uma tríade de evidências que sugerem que o excesso de raios gama no centro da Via Láctea pode ter origem na matéria escura. Os raios gama provenientes de colisões de partículas de matéria escura produziriam o mesmo sinal e teriam as mesmas propriedades que os observados no mundo real, disseram os investigadores – embora não seja uma prova definitiva.

A luz emitida por estrelas de neutrões velhas e revigoradas que giram rapidamente – os chamados pulsares de milissegundo – também poderia explicar o mapa de raios gama existente, as medições e a assinatura do sinal. Mas os investigadores disseram que esta teoria dos pulsares de milissegundo é imperfeita. Para que esses cálculos funcionem, os investigadores têm de assumir que existem mais pulsares de milissegundo do que os que observaram.

As respostas poderão vir com a construção de um novo e enorme telescópio de raios gama chamado CTAO (Cherenkov Telescope Array Observatory). Os investigadores pensam que os dados do telescópio de maior resolução, que tem a capacidade de medir sinais de alta energia, ajudarão os astrofísicos a quebrar o paradoxo.

A equipa de investigação está a planear uma nova experiência para testar se estes raios gama da Via Láctea têm energias mais elevadas, o que significa que são pulsares de milissegundo, ou se são o produto de energias mais baixas de colisões de matéria escura.

“Um sinal limpo seria uma arma fumegante, na minha opinião”, disse Silk.

Entretanto, os investigadores vão trabalhar em previsões sobre onde deverão encontrar matéria escura em várias galáxias anãs selecionadas que rodeiam a Via Láctea. Quando tiverem mapeado as suas previsões, podem compará-las com os dados de alta resolução.

“É possível que vejamos os novos dados e confirmemos uma teoria em detrimento da outra”, disse Silk. “Ou talvez não encontremos nada e, nesse caso, será um mistério ainda maior para resolver”.

// Universidade Johns Hopkins (comunicado de imprensa)
// Instituto Leibniz de Astrofísica de Potsdam (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Physical Review Letters)
// Artigo científico (arXiv)

Saiba mais:

Matéria escura:
Wikipedia

Via Láctea:
Wikipedia
SEDS

Estrelas de neutrões:
Wikipedia
Universidade de Maryland

Pulsares:
Wikipedia
Pulsares de milissegundo (Wikipedia)
Catálogo ATNF de Pulsares

Telescópio Espacial Fermi:
NASA
Wikipedia

CTAO (Cherenkov Telescope Array Observatory):
Página principal
Wikipedia

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