Isaac Newton

A vida de Isaac Newton (figura 1) pode ser dividida em três períodos completamente distintos. O primeiro está nos seus dias de adolescente desde 1643 até à sua nomeação para uma posição universitária em 1669. O segundo período, de 1669 a 1687, foi o período altamente produtivo em que foi professor Lucasiano em Cambridge, posição actualmente ocupada por Stephen Hawking. O terceiro período (quase por tanto tempo como os outros dois combinados), viu Newton como um oficial de governo altamente pago em Londres com pouco interesse adicional na investigação em matemática.

Isaac Newton nasceu na Mansão de Woolsthorpe, perto de Grantham em Lincolnshire. Embora pelo calendário em uso na época, a data do seu nascimento tenha sido no dia de Natal de 1642, a data de 4 Janeiro de 1643 é a data correspondente do calendário gregoriano (o calendário gregoriano não foi adoptado em Inglaterra até 1752).

Figura 1 – Isaac Newton.

Isaac Newton era oriundo de uma família de fazendeiros, mas nunca conheceu o seu pai, também chamado Isaac Newton, que morreu em Outubro de 1642, três meses antes nascimento do filho. Embora o pai de Isaac possuísse a propriedade e animais que fizeram dele um homem rico, era analfabeto e não sabia assinar o seu próprio nome.

A mãe de Isaac, Hannah Ayscough, tornou a casar com Barnabas Smith, um ministro da Igreja em Witham Norte, uma vila próxima, quando Isaac tinha dois anos de idade. A criança foi deixada então ao cuidado da avó Margery Ayscough em Woolsthorpe. Tratado basicamente como um orfão, Isaac não teve uma infância feliz. O seu avô, James Ayscough, nunca foi mencionado por Isaac, e o facto de não ter deixado nada a Isaac no seu testamento, feito quando o menino tinha dez anos de idade, sugere que não havia nenhum amor perdido entre os dois. Não há nenhuma dúvida: Isaac guardou muitos ressentimentos relativamente à mãe e ao padrasto Barnabas Smith. Ao examinar os seus pecados aos dezanove anos de idade, Isaac apresentou como sendo um deles “ameaçar o meu pai e mãe Smith de queimá-los dentro da sua casa.”

Após a morte do seu padrasto em 1653, Newton passou a ter um grande agregado familiar que consistia da mãe, da avó, de um meio-irmão e duas meias irmãs. Newton começou a frequentar a escola livre de gramática em Grantham. Embora esta estivesse a somente cinco milhas da sua casa, ficou a residir com a família Clark em Grantham. No entanto, parece ter mostrado pouco as suas capacidades para o trabalho académico. Um relatório escolar descreveu-o como “preguiçoso” e “desatento”. A sua mãe, agora senhora de uma riqueza e de propriedades razoáveis, pensou que o seu filho mais velho era a pessoa indicada para controlar os seus negócios e a sua propriedade. Isaac, feito o exame, foi afastado da escola, mas mostrou de imediato que não tinha qualquer interesse (ou talento) em controlar uma propriedade.

A pedido do tio, William Ayscough, fica decidido que Isaac se deve preparar para a Universidade, regressando à escola livre da gramática em Grantham em 1660 para terminar a sua instrução escolar. Desta vez fica alojado com Stokes, o director da escola, e pareceria que, apesar das sugestões que não tinha mostrado previamente nenhumas qualidades académicas, Isaac deve ter convencido alguns daqueles em seu redor que possuía capacidades para prosseguir uma carreira académica. Existem evidências que Stokes também tenha persuadido a mãe de Newton a deixá-lo entrar para a Universidade, pelo que é provável que este tenha mostrado mais capacidade no seu primeiro período escolar do que o relatório da escola sugere.

Nada se sabe sobre o que Newton aprendeu na preparação para a Universidade, mas Stokes era um homem capaz e seguramente deu uma boa preparação privada a Isaac. Nada sugere que tenha aprendido toda a matemática, mas nós não podemos desprezar a hipótese de Stokes o introduzir aos elementos de Euclides “que era bem capaz de ensinar” (embora exista uma evidência, mencionada abaixo, de que Newton não leu Euclides antes de 1663). Abundam anedotas sobre a sua habilidade mecânica, sendo normalmente referida a sua habilidade em fazer modelos das máquinas, em particular relógios e moinhos de vento. No entanto, quando os biógrafos procuram informação sobre pessoas famosas, há sempre uma tendência para que os povos relatem o que pensam que se espera dele e estas anedotas podem simplesmente ter sido inventadas mais tarde por aqueles que sentiram que o cientista mais famoso do mundo devia ter tido estas habilidades na escola.

Newton entrou na faculdade do seu tio, a velha faculdade de Cambridge, a 5 de Junho de 1661. Era mais velho do que a maioria dos seus companheiros estudantes mas, apesar do facto da sua mãe ter uma grande capacidade financeira, entrou como um sizar. Um sizar em Cambridge era um estudante que recebia uma permissão para despesas da faculdade em troca de actuar como um empregado de outros estudantes. Há certamente alguma ambiguidade na sua posição como um sizar, porque parece ter-se associado com “os estudantes da classe mais alta” melhor que os restantes sizars. Foi sugerido que Newton pode ter tido Humphrey Babington, um parente distante, como seu patrão. Esta explicação razoável demonstraria que a sua mãe não o teria sujeitado desnecessariamente ao trabalho como é reivindicação dos biógrafos.

O objectivo de Newton em Cambridge era uma licenciatura em advocacia. A instrução em Cambridge foi dominada pela filosofia de Aristóteles mas foi permitida alguma liberdade do estudo no terceiro ano do curso. Newton estudou a filosofia de Descartes, Gassendi, Hobbes, e, em particular, Boyle. A mecânica da Astronomia copernicana de Galileu atraiu-o e estudou também o sistema de Kepler. Gravou os seus pensamentos num livro intitulado Quaestiones Quaedam Philosophicae (Determinadas Perguntas Filosóficas). É uma prova fascinante de como as ideias de Newton tomavam já forma por volta de 1664. Começa o texto com a frase “Platão é meu amigo, Aristóteles é meu amigo, mas o meu melhor amigo é a verdade”, em que se revela um pensador livre num estágio avançado.

Como Newton foi introduzido aos textos matemáticos mais avançados do seu tempo é hoje mais ou menos claro. De acordo com de Moivre, o interesse de Newton pela Matemática começou no Outono de 1663, quando comprou um livro de Astronomia numa feira em Cambridge e percebeu que não podia compreender a Matemática nele contido. Tentando ler um livro de trigonometria, encontrou que lhe faltavam conhecimentos de geometria e assim decidiu-se a ler “Os Elementos” de Euclides.

Mudou então para o Clavis Mathematica de Oughtred e La Géométrie de Descartes. Leu a nova Álgebra e Geometria Analítica de Viète publicada em 1646. Outro grande trabalho da Matemática que estudou por esta altura foi o trabalho recentemente publicado por Schooten, Geometria a Des Cartes, que apareceu em dois volumes em 1659-1661. O livro conteve apêndices importantes escritos por três discípulos de Van Schooten, Jan de Witt, Johan Hudde, e Hendrick van Heuraet. Newton estudou também Álgebra de Wallis e parece que o seu primeiro trabalho matemático original veio do estudo deste livro. Leu o método de Wallis para encontrar um quadrado da área igual a uma parábola e a uma hipérbole que usassem indivisíveis. Newton fez anotações sobre o tratamento de Wallis das séries, mas preparou também as suas próprias demonstrações dos teoremas. Escreveu nas margens “…assim fez de Wallis, mas pode ser feito assim…“.

Seria fácil pensar que o talento de Newton começou a emergir na chegada de Barrow à posição de Lucasiano em Cambridge, em 1663. Certamente a data coincide com o começo dos profundos estudos matemáticos de Newton. No entanto, parece que a data de 1663 é meramente uma coincidência e que somente alguns anos mais tarde é que Barrow reconheceu o génio matemático entre os seus estudantes.

Apesar de algumas evidências inferirem que o seu progresso não tinha sido particularmente bom, Newton recebeu o grau em Abril de 1665. Pareceria que o seu génio científico não tinha emergido ainda, mas surgiu de repente quando uma praga fechou a Universidade no Verão de 1665 e teve que retornar a Lincolnshire. Lá, num período de menos de dois anos, quando Newton tinha ainda menos de 25 anos de idade, começou a apresentar trabalhos revolucionários nas áreas da Matemática, da Óptica, da Física e da Astronomia.

No período em que Newton permaneceu em casa, lançou as fundações do Cálculo Diferencial e Integral, diversos anos antes da sua descoberta por Leibnitz, efectuada por via independente. ‘O método dos fluxiões’, como o chamou, foi baseado na sua introspecção crucial que a integração de uma função é meramente a operação inversa da diferenciação. Fazendo uma análise da diferenciação como operação básica, Newton criou os métodos analíticos simples que unificaram muitas técnicas separadas desenvolvidas previamente para resolver problemas aparentemente não relacionados, como por exemplo a determinação de áreas, de tangentes, dos comprimentos das curvas e dos máximos e mínimos de funções. O Methodis Serierum et Fluxionum de Newton, escrito em 1671, não foi publicado até que John Colson produziu uma tradução inglesa em 1736.

Quando a Universidade de Cambridge reabriu após a praga em 1667, Newton propôs-se como candidato a uma posição. Em Outubro foi eleito para uma posição de assistente na faculdade de Trinity College mas, após ter sido concedido o seu grau de mestre, ascendeu a um cargo de Professor em Julho de 1668 que permitiu que jantasse na mesa dos Professores. Em Julho de 1669, Barrow tentou assegurar-se de que os desenvolvimentos matemáticos de Newton se tornassem conhecidos. Enviou o texto De Analysi de Newton a Collins que vivia em Londres, escrevendo-lhe que:

Newton trouxe-me no outro dia alguns papéis, nos quais estabeleceu métodos de calcular as dimensões de grandezas como aquela do Sr. Mercator a respeito da hipérbole, mas de forma muito geral, e também métodos de resolver equações, que suponho eu, satisfá-lo-ão; e eu enviar-lhos-ei na carta seguinte.

Collins deu a conhecer o trabalho de Newton aos principais matemáticos da época, pelo que a iniciativa de Barrow conduziu a um rápido reconhecimento do seu valor. Collins mostrou a Brounker, o presidente da Royal Society, os resultados de Newton com a permissão deste. Depois disto, Newton pediu a devolução do seu manuscrito pelo que Collins apenas conseguiu referir o trabalho de Newton a Sluze e Gregory, sem que conseguisse explicá-lo convenientemente.

Barrow renunciou à posição de Lucasiano em 1669, recomendando que Newton, apenas com 27 anos, fosse nomeado para o seu lugar. Depois disto, Newton visitou Londres duas vezes tendo-se encontrado com Collins, mas como escreveu a Gregory:

… não tendo não muita confiança com ele, não pensei em apressá-lo a publicar qualquer coisa.

O primeiro trabalho de Newton como Lucasiano foi dar Óptica no curso que começou em Janeiro de 1670. Tinha concluído durante os dois anos da praga que a luz branca não é uma entidade simples. Todos os cientistas, desde Aristóteles, tinham acreditado que a luz branca era uma única entidade básica, mas a aberração cromática numa lente de telescópio convenceu Newton do contrário. Quando passou um feixe fino da luz solar com um prisma de vidro verificou o espectro de cores que se formou.

Defendeu que a luz branca é de facto uma mistura dos diferentes tipos de radiação que quando refractados têm ângulos de refracção ligeiramente diferentes, produzindo cores espectrais diferentes.

Isto levou-o a concluir que as lentes haveriam sempre de ter aberração cromática, pelo que propôs o telescópio reflector. Em 1672, Newton foi eleito membro da Royal Society, após ter oferecido à mesma um telescópio reflector. Ainda nesse ano publicou o seu primeiro artigo sobre luz e cor nas Philosophical Transactions of the Royal Society. O artigo foi genericamente bem recebido mas Hooke e Huygens opuseram-se à tentativa de Newton de provar, através das experiências realizadas, que a luz tem uma natureza corpuscular e não ondulatória. Esta recepção que o seu artigo recebeu não foi a melhor para que Newton melhorasse a sua atitude relativamente a apresentar os resultados do seu trabalho. Era constantemente puxado em duas direcções. Por um lado queria fama e reconhecimento, mas por outro não gostava de críticas, e não publicar era a maneira mais simples de as evitar. Certamente pode dizer-se que a sua reacção às criticas era irracional e a sua necessidade de humilhar publicamente Hooke pela sua opinião era anormal. No entanto, e não obstante a oposição de Hooke, talvez devido à já elevada reputação de Newton, a teoria corpuscular viria a impor-se até que a teoria ondulatória foi de novo retomada no século XIX.

Figura 2 – Isaac Newton a analisar a composição espectral da luz branca.

As relações de Newton com Hooke deterioraram-se ainda mais quando, em 1675, Hooke afirmou que Newton lhe havia roubado alguns resultados de óptica. Apesar de os dois homens terem feito as pazes após uma educada troca de cartas, Newton fechou-se sobre si mesmo e afastou-se da Royal Society, dado que considerava Hooke um dos líderes da mesma. Atrasou a publicação de todo um conjunto de trabalhos de investigação em óptica até depois da morte de Hooke, em 1703. O livro Opticks apareceu em 1704. Para explicar alguns dos resultados teve que usar uma teoria ondulatória conjuntamente com a teoria corpuscular.

No entanto, a maior concretização da obra de Newton dá-se ao nível da Física e da Mecânica Celeste com a teoria da Gravitação Universal. Em 1666, Newton possuía já versões preliminares das suas três leis do movimento. Também havia descoberto a lei que dava conta da força centrífuga no movimento circular uniforme. Todavia, a sua interpretação da mecânica do movimento circular não era ainda a correcta. A ideia inovadora de Newton em 1666 foi imaginar que a gravidade da Terra influenciava o movimento da Lua, contrabalançando a sua força centrífuga. A partir da sua lei da força centrífuga e da terceira Lei de Kepler do movimento planetário, Newton desenvolveu a Lei do inverso do quadrado da distância. Em 1679, Newton correspondia-se com Hooke que lhe havia escrito dizendo:

… que a atracção é sempre dupla da proporção ao centro recíproco …

Depois da troca de correspondência com Hooke, em 1679, Newton, de modo próprio, encontrou uma prova que a lei das áreas de Kepler era uma consequência de forças centrípetas e demonstrou ainda que se a curva orbital é uma elipse sob a acção de uma força central, então existe uma dependência da força com o inverso do quadrado da distância ao centro. Esta descoberta era a confirmação da Segunda Lei de Kepler.

Em 1684, três membros da Royal Society, Sir Christopher Wren, Robert Hooke e Edmond Halley, discutiam sobre se as órbitas elípticas dos planetas poderiam resultar de uma força gravitacional em direcção ao Sol inversamente proporcional ao quadrado da distância. Halley escreveu:

Hooke diz que tem a solução, mas que a ocultaria durante algum tempo, para que outros, por tentarem e falharem, pudessem dar mais valor à descoberta quando fosse tornada pública.

Em 1684, Halley perguntou a Newton qual seria a órbita que um corpo teria se estivesse sob a acção de uma força de lei do inverso do quadrado da distância. Newton respondeu de imediato que seria uma elipse. Embora não encontrasse os papéis com a demonstração, disse a Halley que havia resolvido esse problema quatro anos antes. No entanto, em De Motu apenas se encontra a demonstração inversa. A demonstração de que as forças, obedecendo ao inverso do quadrado da distância, implicam órbitas de secções de cónicas, está escrita na Cor.1 da Prop.13 no Livro 1 do Principia, mas não na sua primeira edição.

Três meses mais tarde Newton envia a Halley uma demonstração da forma das órbitas quando sujeitas a uma força inversamente proporcional ao quadrado da distância. Halley persuadiu Newton a escrever o tratamento integral da sua nova Física. Passado um ano (1687), Newton publicou a obra Philosophiae naturalis principia mathematicaou, simplesmente, Principia, como é geralmente conhecida.

No livro Principia, Newton enuncia pela primeira vez as três leis do movimento que são hoje conhecidas como as Leis de Newton e cujo enunciado (como hoje se aceita) é o seguinte:

1ª Lei (Lei da Inércia) – Um corpo permanece em repouso ou em movimento rectilíneo e uniforme se sobre ele não actuar qualquer força ou se for nula a resultante das forças que sobre ele actuam;

2ª Lei (Lei Fundamental da Dinâmica) – Uma aceleração é proporcional à força que actua sobre um corpo sendo a massa do corpo a constante de proporcionalidade (F=m.a);

3ª Lei (Lei da Acção-Reacção) – Quando um corpo exerce sobre outro uma força, o segundo exerce sobre o primeiro uma força de igual intensidade mas de sentido contrário.

A obra Principia é reconhecida como o livro científico de maior impacto que alguma vez foi escrito. Newton analisou o movimento dos corpos com e sem atrito sob a acção de forças centrípetas. Os resultados foram aplicados a corpos em órbita, projécteis, pêndulos e corpos em queda livre próximos da Terra. Demonstrou ainda que os planetas eram atraídos para o Sol com uma força que variava com o inverso do quadrado da distância e fez a generalização desta demonstração para todos os corpos celestes atraídos uns pelos outros.

O tema central dos Principia era a universalidade da força gravitacional. No livro, Newton estabelece a Lei da Gravitação Universal que diz que:

… toda a matéria atrai toda a restante matéria com uma força proporcional ao produto das duas massas consideradas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre elas.

e que pode escrever-se sob a forma da equação

em que m1 e m2 são as massas dos dois corpos que estão a exercer atracção gravitacional mútua e r é a distância entre os centros dos dois corpos.

Como chegou à Lei propriamente dita, não é muito claro, mas pode tentar-se uma abordagem provável, a partir da demonstração seguinte.

Newton descobriu que a aceleração centrípeta (aceleração dirigida para o centro de curvatura) dos corpos era dada por a=v2/r, uma constatação observacional que já havia sido publicada por Christian Huygens.

Associando esta relação à segunda lei de Newton, obtém-se que um planeta de massa m, movendo-se em redor do Sol com velocidade v numa circunferência de raio r será dada por

Considerando que a circunferência tem um perímetro 2Πr, que demora um período T a ser percorrido, como a velocidade é a distância percorrida por intervalo de tempo tem-se

multiplicando e dividindo por r obtém-se

em que r3/T2 é a constante k da 3ª Lei de Kepler.

Assim, para qualquer planeta orbitando o Sol ter-se-ia que a Força gravitacional exercida pelo Sol seria

ou seja

em que m é a massa do planeta, r é a distância média do planeta ao Sol e k é a constante de Kepler para o Sistema Solar.

Multipliquemos e dividamos pela massa do Sol (M). Obtém-se

Definindo uma constante

Tem-se

Como se vê da demonstração, a expressão apenas seria válida para corpos orbitando em torno do Sol pois a constante G inclui a massa do Sol e a constante de Kepler para planetas orbitando o Sol. Newton deverá ter pensado que provavelmente a razão entre a constante de Kepler para qualquer sistema e a massa do corpo central seria, por si mesma, constante, e terá tentado generalizar para todos os corpos.

Mas como e porquê?

Reza a lenda que Newton viu uma maçã a cair no seu jardim em Lincolnshire, e que terá pensado na força atractiva na direcção da Terra. Pensou que a mesma força que fizera cair a maçã poderia estender-se até à distância da Lua. Conhecia bem o trabalho de Galileu sobre projécteis e sugeriu que o movimento da Lua poderia ser uma extensão natural daquela teoria. Para se entender o que se pretende afirmar com isto, considere-se um revólver que dispara um projéctil horizontalmente do cimo de uma montanha e imagine-se que cada vez se utiliza mais pólvora obtendo-se uma velocidade inicial da bala cada vez maior.

Figura 3 – Trajectória parabólicas de projécteis disparados horizontalmente com diferentes velocidades iniciais.
As trajectórias parabólicas vão ficar cada vez mais planas, e se imaginarmos que a montanha é suficientemente alta para que o atrito possa ser desprezado e o revólver for suficientemente potente, “eventualmente o ponto de queda será tão distante que teremos que considerar a curvatura da Terra ao considerar a curvatura da trajectória, para determinar o ponto de queda.”De facto, a situação é mais drástica, pois a curvatura da Terra pode significar que o projéctil de facto nunca chegue ao solo. Isto foi previsto por Newton no livro Principia através do diagrama seguinte:
O cume da montanha V deve estar bem acima da atmosfera da Terra e com uma velocidade inicial apropriada, o projéctil orbitará a Terra com uma trajectória circular. De facto, a curvatura da Terra é tal que a superfície “cai”, relativamente a uma superfície verdadeiramente horizontal aplicada no ponto de partida considerado cerca de cinco metros nos primeiros 8 km.Como se sabe da cinética de Galileu, a distância vertical percorrida durante a queda de um grave que parte com componente vertical da velocidade nula (situação de repouso ou de lançamento horizontal) é dada pela expressão:

em que g é a aceleração da gravidade (aproximadamente 10 m/s ou ainda mais aproximadamente, 9,8 m/s) e t é o tempo percorrido desde o instante inicial considerado.

Assim sendo, o corpo cai cerca de cinco metros no primeiro segundo, o que significa que se um projéctil fosse disparado horizontalmente com uma velocidade de 8000 m/s, ao fim de um segundo estará a passar horizontalmente à mesma altura 8 km adiante, e assim consecutivamente, segundo após segundo, o que significaria que o corpo descreveria uma órbita circular paralela ao solo.

Figura 4 – Se um projéctil fosse lançado horizontalmente de um monte tão alto que o atrito do ar fosse desprezável, desde que a sua velocidade fosse suficiente entraria em órbita em torno da Terra.

Newton concebeu que a trajectória circular da Lua poderia ser facilmente explicada através da mesma força gravitacional que pode manter o projéctil anterior em órbita baixa. Para pensar neste conceito, consideremos a Lua numa trajectória, começando num instante em particular, desviando-se de uma linha horizontal tal como o projéctil anterior. A primeira questão é saber se a Lua cairá 5 m no primeiro segundo da trajectória. Isto não foi difícil de determinar para Newton, pois a trajectória da Lua já era bem conhecida. A órbita da Lua tem um raio de cerca de 384,000 km (perímetro e é percorrida em 27.3 dias, por isso a distância percorrida num segundo é de cerca de 1 quilómetro, o que implica através de cálculos geométricos que a queda da Lua relativamente à horizontal é de cerca de 1.37 mm. O que significa que a aceleração da gravidade da Lua relativamente à sentida à superfície da Terra é dada pela razão 5000/1.37, o que dá aproximadamente 3600, ou seja, a aceleração sentida pela Lua é 3600 vezes mais pequena que a aceleração sentida por uma maçã à superfície da Terra.

Como a órbita da Lua é cerca de 60 vezes o raio da Terra, a relação entre a força gravitacional sentida por um corpo à superfície da Terra e pela Lua parecem relacionadas pela lei do inverso do quadrado da distância. A constante de gravitação universal para a Lua orbitando em torno da Terra tomaria a forma

tomando a constante G exactamente o mesmo valor que o obtido anteriormente para planetas orbitando em torno do Sol. O valor de G aceite foi obtido por medida é 6.67×10-11 m3kg-1s-2 com as unidades apresentadas no SI.

Figura 5 – Modelo dos vórtices cartesianos, mostrando a trajectória de um cometa a ser afectada pela passagem nos vórtices.

Na obra Principia, Newton explicou uma grande variedade de fenómenos que anteriormente não se consideravam relacionados, tais como os cometas, as marés e as suas variações, a precessão do eixo da Terra e o movimento da Lua devido à sua perturbação pela gravidade do Sol. Este trabalho transformou Newton num líder internacional da investigação científica. Os cientistas da Europa continental não aceitavam a ideia da acção à distância e continuavam a acreditar no modelo de Descartes da teoria dos vórtices segundo a qual cada corpo celeste induzia ao seu redor forças que actuavam por contacto. Isto não impediu que houvesse uma admiração global pela qualidade técnica do trabalho proposto por Newton.

Jaime II tornou-se rei de Inglaterra a 6 de Fevereiro de 1685. Havia-se convertido à Igreja Católica Apostólica Romana em 1669, mas quando subiu ao trono, tinha um forte apoio tanto dos anglicanos como dos Católicos. Houve no entanto rebeliões com o intuito de destronar Jaime II, que fizeram com que o Rei começasse a desconfiar dos anglicanos e a colocar católicos nos postos chave da cadeia militar. Foi ainda mais longe ao apontar apenas católicos para as funções de juízes e oficiais do estado. Sempre que um lugar ficava vago em Oxford ou Cambridge, o rei nomeava um católico para este lugar. Newton era protestante e opôs-se veementemente ao que considerou um ataque à Universidade de Cambridge.

Quando o Rei tentou insistir na atribuição de um grau académico a um monge Beneditino sem que este tivesse que realizar qualquer exame ou prestar quaiquer provas, Newton escreveu ao vice-Chanceler “Be courageous and steady to the Laws and you cannot fail” (Seja corajoso e cumpridor das leis que não poderá errar).

O vice-Chanceler seguiu a recomendação de Newton e foi demitido do seu cargo. Newton continuou a protestar contra o caso, preparando documentos que pudessem ser usados pela Universidade na sua defesa. Entretanto, Guilherme de Orange havia sido convidado por muitos dos líderes britânicos a reunir um exército para ir a Inglaterra derrotar Jaime II. Chegou em Novembro de 1688 e Jaime, ao descobrir que os protestantes haviam abandonado o exército, fugiu para França. A Universidade de Cambridge elegeu Newton, agora famoso pela sua forte defesa da Universidade, como um dos seus dois membros no Parlamento da Convenção a 15 de Janeiro de 1689. O Parlamento viria a atribuir a coroa a Guilherme e Maria no final do mesmo ano.

A partir de 1689, a sua actividade de investigação diminui drasticamente. Após um esgotamento nervoso retira-se definitivamente da actividade de investigador em 1693; o resto da sua vida vai ser dedicada à política.

Figura 6 – O velho Isaac Newton.

Newton foi eleito presidente da Royal Society em 1703 e viria a ser reeleito ano após ano até à sua morte. Da sua actividade como presidente da Royal Society merece destaque a forma como trata da contenda entre si mesmo e Leibnitz no sentido de determinar quem foi o pai do cálculo diferencial. Conta-se que Newton terá nomeado uma comissão “imparcial”, tendo sido ele que redigiu o relatório final da mesma (apesar de o seu nome, obviamente, não constar no mesmo). Escreveu ainda um artigo de revisão anónimo sobre o assunto que foi publicado nas Philosophical Transactions of the Royal Society.

Foi armado cavaleiro (Sir) pela rainha Ana em 1705, tendo sido o primeiro cientista a receber esta honra.

Faleceu no dia 20 de Março de 1727 em Kensington, Middlesex e foi sepultado na Abadia de Westminster.

Reza a lenda que ao avaliar a sua carreira científica, Isaac Newton terá dito certa vez: “Tenho a impressão de ter sido uma criança a brincar à beira-mar, divertindo-me a descobrir uma pedrinha mais lisa ou uma concha mais bonita que as outras, enquanto o imenso oceano da verdade continuou misterioso diante dos meus olhos”.