Fragmentos de asteroides restringem a cronologia das atuais órbitas dos planetas gigantes

Os planetas gigantes do Sistema Solar – Júpiter, Saturno, Úrano e Neptuno – obtidas pelo Telescópio Espacial Hubble, no âmbito do seu programa OPAL (Outer Planet Atmospheres Legacy). Crédito: NASA, ESA, Amy Simon (NASA-GSFC), Michael H. Wong (UC Berkeley); processamento da imagem – Joseph DePasquale (STScI)

Os fragmentos de um asteroide destruído sugerem que a mudança de posição dos planetas gigantes do nosso Sistema Solar, há milhares de milhões de anos, ocorreu entre 60 a 100 milhões de anos após a formação do Sistema Solar e pode ter sido fundamental para a formação da nossa Lua.

Cientistas espaciais liderados pela Universidade de Leicester combinaram evidências de simulações, de observações e análises de meteoritos para recriar a instabilidade orbital causada quando os planetas gigantes do nosso Sistema Solar se deslocaram para as suas posições atuais, um cenário conhecido há 20 anos como o modelo de Nice.

Os resultados foram publicados no passado dia 16 de abril na revista Science e apresentados na Assembleia Geral da União Geológica Europeia, em Viena.

No início do Sistema Solar, os planetas gigantes – Júpiter, Saturno, Úrano e Neptuno – tinham órbitas mais circulares e mais compactas do que as atuais. Investigações anteriores estabeleceram que uma instabilidade orbital no Sistema Solar alterou essa configuração orbital e provocou a dispersão de planetesimais mais pequenos. Muitos destes planetesimais colidiram com os planetas terrestres interiores, naquilo a que os cientistas chamaram o Intenso Bombardeio Tardio.

A autora principal, a Dra. Chrysa Avdellidou, da Escola de Física e Astronomia da Universidade de Leicester, afirmou: “A questão é: quando é que isso aconteceu? As órbitas destes planetas desestabilizaram-se devido a alguns processos dinâmicos e depois assumiram as posições finais que vemos atualmente. Cada momento tem uma implicação diferente e tem sido um grande tema de debate na comunidade.

“O que tentámos com este trabalho foi não fazer apenas um estudo dinâmico puro, mas combinar diferentes tipos de estudos, ligando observações, simulações dinâmicas e estudos de meteoritos.”

A equipa focou-se num tipo de meteorito conhecido como condritos enstatite, que tem uma composição muito semelhante à da Terra e rácios isotópicos muito semelhantes, o que significa que se formou na nossa vizinhança. Através de observações espetroscópicas com telescópios terrestres, os investigadores ligaram esses meteoritos à sua fonte: uma família de fragmentos na cintura de asteroides conhecida como Athor. Isto sugere que Athor era originalmente muito maior, que se formou mais perto do Sol e que sofreu uma colisão que reduziu o seu tamanho para fora da cintura de asteroides.

Para explicar como Athor foi parar à cintura de asteroides, os cientistas testaram vários cenários através de simulações dinâmicas, concluindo que a explicação mais provável era a instabilidade gravitacional que deslocou os planetas gigantes para as suas órbitas atuais. A análise dos meteoritos mostrou que isto ocorreu não antes de 60 milhões de anos após o início da formação do Sistema Solar. Evidências anteriores de asteroides na órbita de Júpiter também colocaram restrições sobre o quão tarde este evento ocorreu, com os cientistas a concluírem que a instabilidade gravitacional deve ter ocorrido entre 60 e 100 milhões de anos após o nascimento do Sistema Solar, há 4,56 mil milhões de anos.

Evidências anteriores mostraram que a Lua da Terra foi formada durante este período, uma hipótese sendo que um planetesimal conhecido como Theia colidiu com a Terra e os detritos dessa colisão formaram a Lua.

O momento da instabilidade orbital é importante porque determina quando se desenvolveriam algumas das características familiares do nosso Sistema Solar – e pode mesmo ter tido um impacto na habitabilidade do nosso planeta.

A Dra. Avdellidou acrescenta: “É como se tivéssemos um puzzle, compreendêssemos que algo deveria ter acontecido e tentássemos colocar os eventos na ordem correta para formar a imagem que vemos hoje. A novidade deste estudo é que não estamos a fazer apenas simulações dinâmicas puras, ou apenas experiências, ou apenas observações telescópicas.

“Houve em tempos cinco planetas interiores no nosso Sistema Solar e não quatro, pelo que isso pode ter implicações noutras coisas, como o modo como formamos planetas habitáveis. Perguntas como: quando é que os objetos vieram trazer materiais voláteis e orgânicos para o nosso planeta e para Marte?”

Marco Delbo, coautor do estudo e Diretor de Investigação do Observatório de Nice, em França, afirmou: “O momento é muito importante porque, no início, o nosso Sistema Solar era povoado por muitos planetesimais. E a instabilidade limpa-os, por isso, se isso acontecer 10 milhões de anos após o início do Sistema Solar, os planetesimais são limpos imediatamente, ao passo que se o fizermos 60 milhões de anos depois, temos mais tempo para trazer materiais para a Terra e para Marte”.

// Universidade de Leicester (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Science)

Saiba mais:

Sistema Solar:
Wikipedia

Formação e evolução do Sistema Solar:
Wikipedia

Modelo de Nice:
Wikipedia

Intenso Bombardeio Tardio:
Wikipedia

Meteoritos condritos enstatite:
Wikipedia

Theia:
Wikipedia

Sobre Miguel Montes

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