Hubble monitoriza o tempo e as estações em Júpiter e Úrano

Composição que mostra uma das duas novas imagens de Júpiter (à esquerda) e também a nova imagem de Úrano (à direita).
Crédito: NASA, ESA, STScI, A. Simon (NASA-GSFC), M. H. Wong (UC Berkeley), J. DePasquale (STScI)

Desde o seu lançamento, em 1990, que o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA tem sido um observador meteorológico interplanetário, mantendo-se atento às atmosferas em constante mudança dos gigantes de gás do Sistema Solar exterior. E é um “olho sem pestanejar” que permite a nitidez e sensibilidade do Hubble para monitorizar um caleidoscópio de atividades complexas ao longo do tempo. Recentemente foram partilhadas novas imagens de Júpiter e Úrano.

Os planetas exteriores para lá de Marte não têm superfícies sólidas para afetar o clima como na Terra. E a luz solar é muito menos capaz de impulsionar a circulação atmosférica. No entanto, estes são mundos em constante mudança. E o Hubble – no seu papel de meteorologista interplanetário – está a acompanhar, como faz todos os anos. O clima de Júpiter é conduzido de dentro para fora, à medida que mais calor atravessa o seu interior do que recebe do Sol. Este calor impulsiona indiretamente ciclos de mudança de cor nas nuvens, como o ciclo que atualmente destaca um sistema alternante de ciclones e anticiclones. Úrano tem estações que passam ao ritmo de um caracol porque são necessários 84 anos terrestres para completar uma órbita em torno do Sol. Mas essas estações são extremas, porque Úrano está inclinado para o lado. À medida que o verão se aproxima no hemisfério norte, o Hubble vê uma crescente calota polar de névoa fotoquímica a alta altitude que parece semelhante ao “smog” sobre as cidades da Terra.

Inaugurado em 2014, o programa OPAL (Outer Planet Atmospheres Legacy) do Telescópio Espacial Hubble tem vindo a fornecer-nos uma visão anual dos planetas gigantes. Aqui ficam algumas imagens recentes.

Júpiter

Duas novas imagens Hubble de Júpiter, a da esquerda obtida a 12 de novembro de 2022 e a segunda (direita) capturada no dia 6 de janeiro de 2023. Clique aqui para ver apenas a da esquerda; clique aqui para ver somente a da direita.
Crédito: NASA, ESA, STScI, A. Simon (NASA-GSFC), M. H. Wong (UC Berkeley), J. DePasquale (STScI)

A previsão meteorológica para Júpiter é tempo tempestuoso a baixas latitudes norte. É visível uma cadeia proeminente de tempestades alternadas, formando uma “rua de vórtices”, como alguns astrónomos planetários lhe chamam. Este é um padrão ondulatório de ciclones e anticiclones aninhados, juntos como as engrenagens alternadas de uma máquina que se move no sentido horário e anti-horário. Se as tempestades se aproximarem o suficiente umas das outras e se fundirem, podem construir uma tempestade ainda maior, potencialmente rivalizando com o tamanho atual da Grande Mancha Vermelha. O padrão escalonado de ciclones e anticiclones impede com que tempestades individuais se fundam. É também vista atividade no interior destas tempestades; na década de 1990 o Hubble não viu quaisquer ciclones e anticiclones com relâmpagos incorporados, mas estas tempestades surgiram na última década. As fortes diferenças de cor indicam que o Hubble está também a ver diferentes alturas e profundidades de nuvens.

A lua laranja Io “fotobomba” esta vista do topo das nuvens multicoloridas de Júpiter, lançando uma sombra em direção ao limbo ocidental do planeta. A resolução do Hubble é tão nítida que consegue ver o aspeto laranja salpicado de Io, o resultado dos seus numerosos vulcões ativos. Estes vulcões foram descobertos pela primeira vez quando a nave espacial Voyager 1 passou pelo sistema joviano em 1979. O interior derretido da lua é sobreposto por uma fina crosta através da qual os vulcões ejetam o material. O enxofre assume várias tonalidades a diferentes temperaturas, razão pela qual a superfície de Io é tão colorida. Esta fotografia foi obtida a 12 de novembro de 2022.

Na segunda imagem de Júpiter, a lendária Grande Mancha Vermelha de Júpiter assume um lugar de destaque. Embora este vórtice seja suficientemente grande para engolir a Terra, na realidade encolheu até ao seu menor tamanho de sempre, de acordo com os registos de observação que datam até há 150 anos. A lua gelada de Júpiter, Ganimedes, pode ser vista a transitar pelo planeta gigante na parte inferior direita. Ligeiramente maior do que o planeta Mercúrio, Ganimedes é a maior lua do Sistema Solar. É um mundo craterado e tem uma superfície principalmente de água gelada com fluxos glaciares aparentes impulsionados pelo calor interno. Esta imagem foi capturada no dia 6 de janeiro de 2023.

Júpiter e as suas grandes luas oceânicas (Ganimedes, Calisto e Europa), são o alvo da Juice (Jupiter Icy Moons Explorer) da ESA. Estão atualmente em curso preparativos para o lançamento desta nave espacial a partir da Guiana Francesa no dia 13 de abril de 2023. Ganimedes é o principal alvo da Juice. Como a próxima ousada missão da humanidade ao Sistema Solar exterior, a Juice irá completar numerosos “flybys” por Ganimedes e eventualmente entrar em órbita da lua. A missão vai explorar vários tópicos chave: o misterioso campo magnético de Ganimedes, o seu oceano oculto, o seu núcleo complexo, o seu conteúdo de gelo e concha, as suas interações com o ambiente local e com o de Júpiter, a sua atividade passada e presente e se a lua poderá ou não ser um ambiente habitável.

Úrano

Duas imagens Hubble de Úrano, a primeira (esquerda) obtida em 2014 e a segunda (direita) no dia 10 de novembro de 2022. Clique aqui para ver apenas a da esquerda; clique aqui para ver somente a da direita.
Crédito: NASA, ESA, STScI, A. Simon (NASA-GSFC), M. H. Wong (UC Berkeley), J. DePasquale (STScI)

O excêntrico planetário, Úrano, gira em torno do Sol de lado à medida que segue a sua órbita de 84 anos, em vez de girar numa posição mais “vertical” como a Terra. O seu eixo de rotação, inclinado horizontalmente, está a apenas 8 graus do plano orbital do planeta. Uma teoria recente propõe que Úrano já teve uma lua tão massiva que o desestabilizou gravitacionalmente e depois colidiu com o planeta. Outras possibilidades incluem impactos gigantescos durante a formação planetária, ou mesmo planetas gigantes exercendo torques ressonantes uns sobre os outros ao longo do tempo. As consequências da inclinação de Úrano são que, durante períodos de tempo até 42 anos, partes de um hemisfério ficam completamente sem luz solar. Quando a sonda Voyager 2 o visitou durante a década de 1980, o polo sul do planeta estava apontado quase diretamente para o Sol. A vista mais recente do Hubble mostra o polo norte a inclinar-se agora para o Sol.

A primeira é uma imagem Hubble de Úrano tirada em 2014, sete anos após o equinócio da primavera no norte, quando o Sol brilhava diretamente sobre o equador do planeta, e mostra uma das primeiras imagens do programa OPAL. Múltiplas tempestades com nuvens de cristais de metano gelado aparecem a latitudes médias norte acima da atmosfera inferior ciano do planeta. O Hubble fotografou o sistema de anéis em 2007, mas os anéis começaram a abrir-se sete anos mais tarde nesta imagem. Nesta altura, o planeta tinha várias pequenas tempestades e até algumas bandas de nuvens ténues.

Na segunda imagem, de 2022, o polo norte de Úrano mostra uma névoa fotoquímica espessa que parece semelhante ao “smog” sobre as cidades. Várias pequenas tempestades podem ser vistas perto da orla da névoa polar. O Hubble tem vindo a seguir o tamanho e brilho da calota polar norte e continua a ficar a mais brilhante ano após ano. Os astrónomos estão a desenredar vários efeitos – da circulação atmosférica, propriedades das partículas e processos químicos – que controlam a forma como a calota polar atmosférica muda com as estações do ano. No equinócio uraniano de 2007, nenhum dos polos era particularmente brilhante. À medida que o solstício de verão no norte se aproxima – terá lugar em 2028 -, a calota pode ficar ainda mais brilhante e estará diretamente apontada para a Terra, permitindo uma boa visão dos anéis e do polo norte; o sistema de anéis aparecerá então de face. Esta imagem foi obtida no dia 10 de novembro de 2022.

// ESA (comunicado de imprensa)
// NASA (comunicado de imprensa)
// ESA/Hubble (comunicado de imprensa)
// STScI (comunicado de imprensa)

Saiba mais:

Júpiter:
NASA
Nine Planets
Wikipedia

Io:
NASA
Nine Planets
Wikipedia

Ganimedes:
NASA
Nine Planets
Wikipedia

Úrano:
NASA
Nine Planets
Wikipedia

Telescópio Espacial Hubble:
Hubble, NASA 
ESA
Hubblesite
STScI
SpaceTelescope.org
Base de dados do Arquivo Mikulski para Telescópios Espaciais
Programa OPAL

JUICE (Jupiter Icy Moons Explorer):
ESA
Wikipedia

Sobre Miguel Montes

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