Um buraco negro gigante destrói uma estrela massiva

Esta ilustração artística mostra o rescaldo do “evento de perturbação de marés” denominado ASASSN-14li, em que uma estrela foi despedaçada depois de se aproximar demasiado de um buraco negro supermassivo. Depois da estrela ter sido despedaçada, parte do seu gás (vermelho) orbitou e caiu no buraco negro, enquanto uma parte do gás foi expulsa por um vento (azul). Os cientistas utilizaram um espetro de raios X do Chandra para sondar os elementos contidos neste vento, incluindo a deteção de azoto. Os dados de raios X indicam que a estrela do evento ASASSN-14li tinha cerca de três vezes a massa do Sol, o que faz dela uma das maiores estrelas já conhecidas a ser destruída num evento de perturbação de marés.
Crédito: NASA/CXC/Universidade de Michigan/J. Miller et al.; ilustração – NASA/CXC/M.Weiss

Os astrónomos fizeram um estudo forense minucioso de uma estrela que foi dilacerada quando se aventurou demasiado perto de um buraco negro gigante e depois teve as suas entranhas atiradas para o espaço.

O Observatório de raios X Chandra da NASA e o XMM-Newton da ESA estudaram a quantidade de azoto e de carbono perto de um buraco negro que se sabe ter despedaçado uma estrela. Os astrónomos pensam que estes elementos foram criados no interior da estrela antes desta se ter despedaçado ao aproximar-se do buraco negro.

“Estamos a ver as entranhas do que costumava ser uma estrela”, disse Jon Miller, da Universidade de Michigan, que liderou o estudo. “Os elementos deixados para trás são pistas que podemos seguir para descobrir que tipo de estrela encontrou o seu fim”.

Nos últimos anos, os astrónomos têm encontrado muitos exemplos de “eventos de perturbação de marés”, em que as forças gravitacionais de um buraco negro massivo destroem uma estrela. Isto provoca uma erupção, frequentemente observada no visível, no ultravioleta e em raios X, à medida que os detritos da estrela são aquecidos. Este evento, denominado ASASSN-14li, destaca-se por várias razões.

À altura da descoberta, em novembro de 2014, foi a perturbação de marés mais próxima da Terra (290 milhões de anos-luz) descoberta numa década. Devido a esta proximidade, ASASSN-14li forneceu um nível extraordinário de pormenores sobre a estrela destruída. A equipa de Miller aplicou novos modelos teóricos para fazer melhores estimativas, em comparação com trabalhos anteriores, da quantidade de azoto e carbono em torno do buraco negro.

“Estes telescópios de raios X podem ser usados como ferramentas forenses no espaço”, disse a coautora Brenna Mockler dos Observatórios Carnegie e da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. “A quantidade relativa de azoto e carbono que encontrámos aponta para material do interior de uma estrela condenada com cerca de três vezes a massa do Sol.”

A estrela do evento ASASSN-14li é, portanto, uma das mais massivas – talvez a mais massiva – que os astrónomos viram ser destruída por um buraco negro até hoje.

“ASASSN-14li é excitante porque uma das coisas mais difíceis com as perturbações de marés é ser capaz de medir a massa da estrela azarada, como fizemos aqui,” disse o coautor Enrico Ramirez-Ruiz da Universidade da Califórnia, Santa Cruz. “Observar a destruição de uma estrela massiva, por um buraco negro supermassivo, é fascinante porque se espera que as estrelas mais massivas sejam significativamente menos comuns do que as estrelas de menor massa.”

No início deste ano, outra equipa de astrónomos relatou o acontecimento “Barbie assustadora”, em que estimaram que uma estrela com cerca de 14 vezes a massa do Sol foi destruída por um buraco negro. No entanto, este fenómeno ainda não foi confirmado como uma perturbação de marés, com a estimativa da massa da estrela a basear-se principalmente no brilho da erupção e não numa análise detalhada do material em torno do buraco negro, como no caso de ASASSN-14li.

Outro aspeto interessante do resultado de ASASSN-14li é o que significa para estudos futuros. Os astrónomos observaram estrelas moderadamente massivas como ASASSN-14li no enxame estelar que contém o buraco negro supermassivo no centro da nossa Galáxia. Por conseguinte, a capacidade de estimar as massas estelares de estrelas perturbadas pelas marés pode dar aos astrónomos uma forma de identificar a presença de enxames estelares em torno de buracos negros supermassivos em galáxias mais distantes.

Até este estudo, havia uma forte possibilidade de que os elementos observados em raios X pudessem ser provenientes de gás libertado em erupções anteriores do buraco negro supermassivo. O padrão de elementos aqui analisado, no entanto, parece ter vindo de uma única estrela.

Um trabalho anterior, publicado em 2017 por Chenwie Yang, da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hefei, na China, utilizou dados ultravioletas do Telescópio Espacial Hubble da NASA para mostrar que há mais azoto do que carbono em ASASSN-14li, mas em menor quantidade do que a equipa de Miller encontrou utilizando dados de raios X. Esses autores calcularam que a estrela tinha apenas uma massa equivalente a 0,6 sóis.

O novo artigo científico foi publicado na edição de 20 de agosto de 2023 da revista The Astrophysical Journal Letters e está disponível online. Os outros autores do artigo, para além de Miller, Mockler e Ramirez-Ruiz, são Paul Draghis (Universidade de Michigan), Jeremy Drake (Centro para Astrofísica | Harvard & Smithsonian), John Raymond (CfA), Mark Reynolds (Universidade de Michigan), Xin Xiang (Universidade de Michigan), Sol Bin Yun (Universidade de Michigan) e Abderahmen Zoghbi (Universidade de Maryland).

// NASA (comunicado de imprensa)
// Chandra/Harvard (comunicado de imprensa)
// Universidade de Michigan (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (The Astrophysical Journal Letters)
// Artigo científico (arXiv.org)

Saiba mais:

Notícias relacionadas:
SPACE.com
PHYSORG

Buraco negro:
Wikipedia
Evento de perturbação de marés (Wikipedia)

ASAS-SN:
Página oficial (Universidade Estatal do Ohio) 
Wikipedia

Observatório de raios X Chandra:
NASA
Universidade de Harvard
Wikipedia

Observatório XMM-Newton:
ESA
Wikipedia

Sobre Miguel Montes

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