TESS da NASA permite estudo inovador de pulsações estelares confusas

Graças a dados do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, os astrónomos detetaram padrões de pulsação elusivos em dezenas de jovens estrelas de rápida rotação. A descoberta vai revolucionar a capacidade dos cientistas em estudar detalhes como as idades, os tamanhos e as composições destas estrelas – todas membros de uma classe com o nome de protótipo Delta Scuti.

“As estrelas Delta Scuti claramente pulsam de maneiras interessantes, mas os padrões destas pulsações até agora desafiaram a nossa compreensão,” disse Tim Bedding, professor de astronomia da Universidade de Sydney. “Para usar uma analogia musical, muitas estrelas pulsam ao longo de acordes simples, mas as estrelas Delta Scuti são complexas, com notas que parecem confusas. O TESS mostrou-nos que isso não é verdade para todas.”

O artigo que descreve os achados, liderado por Bedding, foi publicado na edição de 14 de maio da revista Nature e está disponível online.

Ondas sonoras que ressaltam dentro de uma estrela fazem com que ela se expanda e contraia, o que resulta em alterações detetáveis de brilho. Esta animação mostra um tipo de pulsação Delta Scuti – chamada modo radial – que é impulsionada por ondas (setas azuis) que viajam entre o núcleo e a superfície da estrela. Na realidade, uma estrela pode pulsar de muitas maneiras diferentes, criando padrões complicados que permitem com que os cientistas aprendam mais sobre o seu interior. Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA

Os geólogos que estudam as ondas sísmicas dos terremotos descobriram a estrutura interna da Terra pela maneira como as reverberações mudavam de velocidade e direção à medida que viajam pelas várias camadas. Os astrónomos aplicam o mesmo princípio para estudar o interior das estrelas através das suas pulsações, um campo chamado asterossismologia.

As ondas sonoras viajam pelo interior de uma estrela a velocidades que mudam com a profundidade e todas se combinam em padrões de pulsação à superfície da estrela. Os astrónomos podem detetar estes padrões como pequenas flutuações no brilho e usá-los para determinar a idade, temperatura, composição, estrutura interna e outras propriedades da estrela.

As estrelas Delta Scuti têm entre 1,5 e 2,5 vezes a massa do Sol. Têm o nome Delta Scuti em honra à estrela dessa constelação (Escudo), visível a olho nu no hemisfério sul, identificada pela primeira vez como variável em 1900. Desde então, os astrónomos identificaram milhares mais como do tipo Delta Scuti, muitas com o telescópio espacial Kepler da NASA, outra missão de caça exoplanetária que operou de 2009 a 2018.

Mas os cientistas tiveram problemas para interpretar as pulsações Delta Scuti. Estas estrelas geralmente giram uma ou duas vezes por dia, pelo menos uma dúzia de vezes mais depressa que o Sol. A rápida rotação achata as estrelas nos seus polos e baralha os padrões de pulsação, tornando-os mais complicados e difíceis de decifrar.

Para determinar se existe ordem nas pulsações aparentemente caóticas das estrelas Delta Scuti, os astrónomos precisaram de observar um grande conjunto de estrelas várias vezes com amostragem rápida. O TESS monitoriza grandes áreas do céu 27 dias de cada vez, obtendo uma imagem completa a cada 30 minutos com cada uma das suas quatro câmaras. Esta estratégia de observação permite que o TESS rastreie as mudanças no brilho estelar provocadas pelos planetas que passam em frente das estrelas, o que é a sua missão principal, mas as exposições de meia-hora são demasiado longas para capturar os padrões mais rapidamente pulsantes das estrelas Delta Scuti. Essas mudanças podem ocorrer em minutos.

Mas o TESS também captura instantâneos de alguns milhares de estrelas pré-selecionadas – incluindo algumas estrelas Delta Scuti – a cada dois minutos. Quando Bedding e seus colegas começaram a analisar as medições, encontraram um subconjunto de estrelas Delta Scuti com padrões de pulsação regulares. Assim que sabiam o que procurar, pesquisaram outros exemplos em dados do Kepler, que usou uma estratégia de observação semelhante. Também realizaram observações de acompanhamento com telescópios terrestres, incluindo o Observatório W. M. Keck no Hawaii e dois da rede global do Observatório Las Cumbres. No total, identificaram um lote de 60 estrelas Delta Scuti com padrões claros.

“Isto é realmente um avanço. Agora, temos uma série regular de pulsações para estas estrelas que podemos entender e comparar com os modelos,” disse o coautor Simon Murphy, investigador de pós-doutorado da Universidade de Sydney. “Isto permitirá medirmos estas estrelas usando asterossismologia de uma maneira que nunca conseguimos antes fazer. Mas também mostrou que este é apenas um passo em frente para o entendimento das estrelas Delta Scuti.”

As pulsações no bem-comportado grupo Delta Scuti enquadram-se em duas categorias principais, ambas provocadas pelo armazenamento e pela libertação de energia na estrela. Algumas ocorrem quando a estrela inteira se expande e se contrai simetricamente. Outras ocorrem quando os hemisférios opostos se expandem e contraem alternadamente. A equipa de Bedding deduziu as alterações através do estudo das flutuações de brilho de cada estrela.

Os dados já ajudaram a resolver um debate sobre a idade de uma estrela, chamada HD 31901, membro de uma corrente estelar descoberta recentemente e que orbita na nossa Galáxia. Os cientistas classificaram a idade da corrente estelar em mil milhões de anos, com base na idade de uma gigante vermelha que suspeitavam pertencer ao mesmo grupo. Uma estimativa posterior, baseada em períodos de rotação de outros membros da corrente estelar, sugeriu uma idade de apenas 120 milhões de anos. A equipa de Bedding usou as observações do TESS para criar um modelo asterossísmico de HD 31901 que suporta a idade mais jovem.

“As estrelas Delta Scuti têm sido alvos frustrantes por causa das suas oscilações complicadas, de modo que esta é uma descoberta muito emocionante,” disse Sarbani Basu, professor de astronomia da Universidade de Yale em New Haven, no estado norte-americano de Connecticut, que estuda asterossismologia mas não participou no estudo. “Ser capaz de encontrar padrões simples e identificar os modos de oscilação muda completamente o jogo. Como este subconjunto de estrelas permite análises sísmicas normais, vamos poder finalmente caracterizá-las adequadamente.”

A equipa pensa que o seu subconjunto de 60 estrelas tem padrões claros porque são mais jovens do que as outras estrelas Delta Scuti, tendo apenas recentemente assentado na produção de toda a sua energia através de fusão nuclear nos seus núcleos. Os pulsos ocorrem mais rapidamente nas estrelas incipientes. À medida que as estrelas envelhecem, a frequência das pulsações diminui e misturam-se com outros sinais.

Outro fator pode ser o ângulo de visão do TESS. Os cálculos teóricos preveem que os padrões de pulsação de uma estrela giratória devem ser mais simples quando o seu polo rotacional está voltado para nós, em vez de a vermos no equador. O conjunto de dados do TESS da equipa incluiu cerca de 1000 estrelas Delta Scuti, o que significa que algumas delas, por acaso, devem estar a ser observadas perto dos polos.

Os cientistas vão continuar a desenvolver os seus modelos à medida que o TESS começa a obter imagens completas a cada 10 minutos em julho, em vez de a cada meia-hora. Bedding disse que a nova estratégia de observação vai ajudar a capturar as pulsações de ainda mais estrelas do tipo Delta Scuti.

“Sabíamos, quando construímos o TESS, que, além de encontrar muitos novos e emocionantes exoplanetas, o satélite também avançaria o campo da asterossismologia,” disse George Ricker, investigador principal do TESS no Instituto Kavli de Astrofísica e Pesquisa Espacial do MIT (Massachusetts Institute of Technology) em Cambridge. “A missão já descobriu um novo tipo de estrela que pulsa apenas de um lado e desvendou novos factos sobre estrelas bem conhecidas. Ao concluirmos a missão inicial de dois anos e ao iniciarmos a missão estendida, estamos ansiosos por uma variedade de novas descobertas estelares que o TESS irá fazer.”

// NASA (comunicado de imprensa)
// Universidade de Sydney (comunicado de imprensa)
// Universidade do Hawaii (comunicado de imprensa)
// Universidade de Birmingham (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Nature)
// Artigo científico (arXiv.org)

Saiba mais:

Notícias relacionadas:
Nature
EurekAlert!
science alert
SpaceRef
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COSMOS
Futurism
Inverse
Forbes
UPI
CNN
sky news

Variáveis do tipo Delta Scuti:
Wikipedia
Estrela Delta Scuti (Wikipedia)

Asterossismologia:
Wikipedia 
asteroseismology.org

Estrutura estelar:
Wikipedia

TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite):
NASA
NASA/Goddard
Programa de Investigadores do TESS (HEASARC da NASA)
MAST (Arquivo Mikulski para Telescópios Espaciais)
Exoplanetas descobertos pelo TESS (NASA Exoplanet Archive)
Wikipedia

Telescópio Espacial Kepler:
NASA (página oficial)
K2 (NASA)
Arquivo de dados do Kepler
Arquivo de dados da missão K2
Wikipedia

Observatório W. M. Keck:
Página principal
Wikipedia

Observatório Las Cumbres:
Página principal
Wikipedia

Sobre Miguel Montes

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