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"Acidente" celeste lança luz sobre enigma de Júpiter e Saturno
16 de setembro de 2025
 

Esta ilustração mostra uma anã castanha - um objeto maior do que um planeta, mas não suficientemente massivo para iniciar a fusão no seu núcleo, como uma estrela. As anãs castanhas são quentes quando se formam e podem brilhar como esta na imagem, mas com o tempo aproximam-se, em temperatura, dos planetas gigantes gasosos como Júpiter.
Crédito: NOIRLab/NSF/AURA/R. Proctor
 
     
 
 
 

Porque é que o silício, um dos elementos mais comuns no Universo, passou praticamente despercebido nas atmosferas de Júpiter, Saturno e de planetas de gás que orbitam outras estrelas? Um novo estudo que utiliza observações do Telescópio Espacial James Webb da NASA lança luz sobre esta questão, centrando-se num objeto peculiar que os astrónomos descobriram por acaso em 2020 e a que chamaram "O Acidente".

Os resultados foram publicados no passado dia 4 de setembro na revista Nature.

O Acidente é uma anã castanha, uma bola de gás que não é bem um planeta nem uma estrela. Mesmo entre as suas congéneres já difíceis de classificar, O Acidente tem uma mistura intrigante de características físicas, algumas das quais só se viam anteriormente em anãs castanhas jovens e outras só em anãs antigas. Devido a essas características, escapou aos típicos métodos de deteção antes de ser descoberta há cinco anos por um cidadão cientista que participava no programa Backyard Worlds: Planet 9. O programa permite que pessoas de todo o mundo procurem novas descobertas nos dados do NEOWISE (Near-Earth Object Wide-field Infrared Survey Explorer) da NASA, que foi gerido pelo JPL da NASA no sul do estado da Califórnia.

O Acidente é tão ténue e estranha que os investigadores precisaram do mais poderoso observatório espacial da NASA, o Telescópio James Webb, para estudar a sua atmosfera. Entre várias surpresas, encontraram indícios de uma molécula que não conseguiram identificar inicialmente. Trata-se de uma simples molécula de silício chamada silano (SiH4). Há muito que os investigadores esperavam - mas não conseguiam - encontrar silano não só nos gigantes gasosos do nosso Sistema Solar, mas também nos milhares de atmosferas pertencentes às anãs castanhas e aos gigantes gasosos que orbitam outras estrelas. O Acidente é o primeiro objeto onde esta molécula foi identificada.

 
Como se pode ver nesta imagem, as anãs castanhas podem ser muito mais massivas do que os grandes planetas gasosos como Júpiter e Saturno. No entanto, tendem a não ter a massa que dá início à fusão nuclear nos núcleos das estrelas, fazendo-as brilhar.
Crédito: NASA/JPL-Caltech
 

Os cientistas estão bastante confiantes de que o silício existe nas atmosferas de Júpiter e Saturno, mas que está escondido. Ligado ao oxigénio, o silício forma óxidos, como o quartzo, que podem semear nuvens em gigantes gasosos quentes, à semelhança das tempestades de poeira na Terra. Em gigantes gasosos mais frios como Júpiter e Saturno, este tipo de nuvens afundar-se-ia muito abaixo das camadas mais leves de vapor de água e de nuvens de amoníaco, até que quaisquer moléculas contendo silício estivessem nas profundezas da atmosfera, invisíveis até às naves espaciais que estudaram estes dois planetas de perto.

Alguns investigadores também postularam que moléculas mais leves de silício, como o silano, deveriam ser encontradas mais acima nestas camadas atmosféricas, deixadas para trás como vestígios de farinha na mesa de um padeiro. O facto de tais moléculas não terem aparecido em lado nenhum, exceto numa única e peculiar anã castanha, sugere algo sobre a química que ocorre nestes ambientes.

"Por vezes, são os objetos extremos que nos ajudam a compreender o que se passa nos objetos mais comuns", disse Faherty, investigador do Museu Americano de História Natural, em Nova Iorque, e principal autor do novo estudo.

Feliz Acidente

Localizada a cerca de 50 anos-luz da Terra, O Acidente formou-se provavelmente há 10 a 12 mil milhões de anos, o que a torna uma das anãs castanhas mais antigas já descobertas. O Universo tem cerca de 14 mil milhões de anos e, na altura em que O Acidente se desenvolveu, o cosmos continha sobretudo hidrogénio e hélio, com vestígios de outros elementos, incluindo o silício. Ao longo dos éones, elementos como o carbono, o azoto e o oxigénio foram-se formando nos núcleos das estrelas, pelo que os planetas e as estrelas que se formaram mais recentemente possuem mais desses elementos.

As observações do Acidente pelo Webb confirmam que o silano se pode formar nas atmosferas de anãs castanhas e de planetas. O facto de o silano parecer estar ausente noutras anãs castanhas e planetas gigantes gasosos sugere que, quando o oxigénio está disponível, liga-se ao silício a uma taxa tão elevada e tão facilmente que praticamente não sobra silício para se ligar ao hidrogénio e formar silano.

 
A anã castanha, apelidada de "O Acidente", pode ser vista em movimento no canto inferior esquerdo deste vídeo, que mostra dados do NEOWISE (Near-Earth Object Wide-Field Infrared Survey Explorer) da NASA, agora aposentado, lançado em 2009 com o nome de WISE.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Dan Caselden
 

Então, porque é que existe silano n'O Acidente? Os autores do estudo supõem que é porque havia muito menos oxigénio no Universo quando a antiga anã castanha se formou, resultando em menos oxigénio na sua atmosfera para absorver todo o silício. O silício disponível ter-se-ia ligado ao hidrogénio, dando origem ao silano.

"Não procurávamos resolver um mistério sobre Júpiter e Saturno com estas observações", disse Peter Eisenhardt do JPL, cientista de projeto da missão WISE (Wide-field Infrared Survey Explorer), que mais tarde foi readaptada como NEOWISE. "Uma anã castanha é uma bola de gás como uma estrela, mas sem um reator de fusão interno, fica cada vez mais fria, com uma atmosfera como a dos planetas gigantes gasosos. Queríamos ver porque é que esta anã castanha é tão estranha, mas não estávamos à espera de silano. O Universo continua a surpreender-nos".

As anãs castanhas são muitas vezes mais fáceis de estudar do que os exoplanetas gigantes gasosos, porque a luz de um planeta distante é normalmente abafada pela estrela que orbita, ao passo que as anãs castanhas geralmente estão sozinhas. E as lições aprendidas com estes objetos estendem-se a todos os tipos de planetas, incluindo os que se encontram fora do nosso Sistema Solar e que podem apresentar potenciais sinais de habitabilidade.

"Para ser claro, não estamos a encontrar vida nas anãs castanhas", disse Faherty. "Mas a um nível elevado, ao estudar toda esta variedade e complexidade de atmosferas planetárias, estamos a preparar os cientistas que um dia terão de fazer este tipo de análise química para planetas rochosos, potencialmente semelhantes à Terra. Pode não envolver especificamente o silício, mas eles vão obter dados complicados e confusos que não encaixam nos seus modelos, tal como nós. Terão de analisar todas essas complexidades se quiserem responder a essas grandes questões".

// NASA (comunicado de imprensa)
// NOIRLab (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Nature)

 


Quer saber mais?

CCVAlg - Astronomia:
03/09/2021 - Uma descoberta acidental sugere uma população oculta de objetos cósmicos

O Acidente (WISEA J153429.75-104303.3):
Wikipedia

Anãs castanhas:
Wikipedia
Andy Lloyd's Dark Star Theory

Silano:
Wikipedia

WISE (ou NEOWISE):
NASA
ipac
Wikipedia

JWST (Telescópio Espacial James Webb):
NASA
STScI
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