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"Ideia louca" sobre os efeitos de arrefecimento da neblina de Plutão
10 de junho de 2025
 
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A sonda New Horizons da NASA captou esta imagem da superfície de Plutão envolta numa neblina atmosférica.
Crédito: NASA/JHUAPL/SwRI
 
     
 
 
 

As primeiras observações de Plutão, pelo Telescópio Espacial James Webb (JWST) da NASA, revelam fenómenos dramáticos na sua superfície, como ciclos sazonais de redistribuição de gelo volátil pela sua superfície e material a ser puxado da sua própria atmosfera para o satélite principal, Caronte - uma misteriosa interação que não acontece em mais nenhum lugar do nosso Sistema Solar.

Estas condições exóticas estão descritas em pormenor numa série de estudos publicados esta primavera por uma equipa internacional de investigadores. Mas embora a imagem de moléculas da atmosfera de um globo, à deriva pelo espaço e a fixarem-se nos polos norte e sul do seu companheiro celeste, pareça estranha, um investigador da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, que faz parte da equipa, está a sorrir.

O artigo científico mais recente, publicado dia 2 de junho na revista Nature Astronomy, confirma as hipóteses feitas pela primeira vez por Xi Zhang acerca da atmosfera de Plutão, com base no "flyby" histórico da nave espacial New Horizons da NASA em 2015, que deu aos investigadores o olhar mais próximo até à data do curioso objeto no limite do Sistema Solar. Menos de uma década antes, Plutão tinha sido relegado de planeta principal para "planeta anão" devido a vários critérios cósmicos que este não satisfazia.

"Uma ideia louca"

Na sequência das observações de Plutão pela New Horizons, Zhang publicou em 2017 um artigo científico que levantava a hipótese de a atmosfera de Plutão ser dominada por partículas de neblina, o que a tornaria completamente diferente das outras atmosferas do Sistema Solar. Zhang, professor de ciências da Terra e planetárias, postulou que estas partículas de neblina aquecem e arrefecem, controlando todo o equilíbrio energético na atmosfera de Plutão.

"Era uma ideia louca", disse Zhang, acrescentando que muitos dos seus colegas na altura se mostraram céticos. Mas ele e os seus coautores também fizeram uma previsão clara no seu artigo científico de 2017: se a neblina está a arrefecer Plutão, deve estar a emitir forte radiação no infravermelho médio, e isso deve ser observável assim que um telescópio grande e poderoso o suficiente estiver disponível para os astrónomos.

Esse momento chegou no dia de Natal de 2021, quando a NASA lançou o JWST para o espaço, permitindo observações que ultrapassariam em muito as efetuadas pelos seus antecessores terrestres ao longo das últimas décadas. Zhang disse que o atual estudo do JWST foi motivado pela sua hipótese de 2017. "Ficámos muito orgulhosos, porque confirmou a nossa previsão", disse. "Na ciência planetária, não é comum ter uma hipótese confirmada tão rapidamente, em apenas alguns anos. Por isso, sentimo-nos muito sortudos e muito entusiasmados".

Condições nubladas

A passagem por Plutão, em 2015, revelou um mundo com paisagens surpreendentes, marcadas por uma topografia complexa - bacias, montanhas e vales - atividade geológica em curso, como glaciares de azoto (N₂) e metano (CH₄), e uma atmosfera quimicamente rica contendo compostos voláteis como N₂, CH₄ e monóxido de carbono. A atmosfera nublada de Plutão formou-se a partir da fotoquímica acoplada do metano e do azoto, semelhante à neblina em torno da lua de Saturno, Titã.

Em contraste, Caronte mostrou não ter uma atmosfera e ter uma superfície mais uniforme dominada por água gelada misturada com compostos à base de amoníaco. Pensa-se que as suas regiões polares, mais escuras e avermelhadas, resultam da captura e transformação química de moléculas de CH₄ que escapam da atmosfera de Plutão.

As recentes observações do Webb fornecem um novo olhar sobre este sistema distante. Como relatado na série de artigos científicos publicados esta primavera, pela primeira vez, o instrumento MIRI do telescópio permitiu medições separadas da emissão térmica no infravermelho médio de Plutão e Caronte sob a forma de curvas de luz a 18, 21 e 25 µm.

Depois, em maio de 2023, o instrumento captou um espetro de alta qualidade no infravermelho médio (4,9-27 μm) de Plutão e da sua atmosfera. Esta gama espetral, anteriormente inexplorada devido à sensibilidade insuficiente dos instrumentos anteriores, revelou uma riqueza química inesperada que levou a uma melhor compreensão dos processos atmosféricos e da origem dos gelos de Plutão.

Pistas cósmicas escondidas na neblina

As curvas de luz do JWST também revelaram variações na radiação térmica da superfície de Plutão e de Caronte durante as suas rotações. Ao comparar estes dados com modelos térmicos, os investigadores foram capazes de colocar fortes restrições na inércia térmica, emissividade e temperatura de diferentes regiões de Plutão e de Caronte. São estas propriedades que determinam a distribuição global de gelo em Plutão e o êxodo de moléculas atmosféricas para Caronte.

Os novos dados do JWST também confirmaram uma segunda previsão, feita pelo antigo aluno de doutoramento de Zhang, Linfeng Wan, outro coautor do artigo da Nature Astronomy. As novas observações estão em boa concordância com a previsão central do seu estudo de 2023 sobre a amplitude da curva de luz rotacional de Caronte.

"Plutão situa-se num ponto realmente único no que diz respeito ao comportamento das atmosferas planetárias. Por isso, dá-nos a oportunidade de expandir a nossa compreensão de como a neblina se comporta em ambientes extremos", explicou Zhang. "E não se trata apenas de Plutão - sabemos que a lua de Neptuno, Tritão, e a lua de Saturno, Titã, também têm atmosferas semelhantes de azoto e de hidrocarbonetos, cheias de partículas de neblina. Por isso, também temos de repensar o seu papel".

E, acrescentou Zhang, há uma ligação ainda mais profunda. "Antes do oxigénio se acumular na atmosfera da Terra, há cerca de 2,4 mil milhões de anos, já existia vida. Mas nessa altura, a atmosfera da Terra era totalmente diferente - sem oxigénio, principalmente azoto, e com muita química de hidrocarbonetos", disse. "Por isso, ao estudar a neblina e a química de Plutão, podemos obter novos conhecimentos sobre as condições que tornaram a Terra habitável".

Para o artigo da Nature Astronomy, Zhang e o seu antigo aluno de doutoramento Linfeng Wan contribuíram com modelos teóricos para interpretar os dados do JWST, calculando os espetros térmicos e reavaliando as taxas de arrefecimento da atmosfera de Plutão. A equipa por detrás da série de artigos científicos foi liderada por investigadores do LESIA (Laboratory of Space Studies and Instrumentation in Astrophysics), no Observatório de Paris, e da Universidade de Reims Champagne-Ardenne.

// Universidade da Califórnia em Santa Cruz (comunicado de imprensa)
// Artigo científico (Nature Astronomy)
// Artigo científico de Zhang et al., 2017 (Nature)
// Artigo científico de Wan et al., 2023 (The Astrophysical Journal)

 


Quer saber mais?

Plutão:
NASA
Wikipedia

Caronte:
NASA
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JWST (Telescópio Espacial James Webb):
NASA
STScI
STScI (website para o público)
ESA
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MIRI (NASA)
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